Fama e Anonimato

Luz: a estação, os museus e o jardim

A Estação da Luz recebe em média 450 mil pessoas por dia e pode ser considerada o coração de São Paulo

Se São Paulo fosse um organismo vivo, não seria demasiado dizer que o coração da cidade fica na estação da Luz, por onde em média, 450 mil pessoas passam diariamente. Somada a arquitetura do local, os museus e o jardim que a cercam, a estação é a concretização da diversidade que a capital paulista apresenta. Mas ao mesmo tempo que é um ponto turístico, a Luz é uma das regiões onde mais são registrados roubos e furtos.

Um lugar histórico, assombrado pelos problemas da Cracolândia, instalada até o primeiro trimestre de 2022 a pouco menos de 700 metros da estação, no entorno da praça Júlio Prestes. Segundo dados apresentados pela Secretária de Segurança Pública de São Paulo, no período entre 29 de maio a 4 de junho de 2023, foram registrados 25 boletins de ocorrência envolvendo furto de celulares e outros objetos na estação da Luz.

A estação da Luz atende às linhas de trem 7 e 11 da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM), e as linhas 1 e 4 do Metrô de São Paulo. Essa última, considerada a linha “nobre” do metrô paulista pelos pontos que cruza, como a Rua Oscar Freire e as avenidas Paulista e Faria Lima. Porém, por maior que seja a nobreza, atualmente ela não é a melhor opção para quem não conhece a região.

Isso porque as duas saídas da da linha 4-amarela convivem com obras que atualmente deixam o acesso longe e um pouco perigoso. A primeira, pela Rua Brigadeiro Tobias, esta cercada de tapumes, e é um caminho que poucos pedestres fazem. A segunda saída, pela Avenida Cásper Libero, está em meio a obra de um túnel, e quem sair por lá deverá passar por uma espécie de beco com bares pouco convidativos e uma zona com tráfico e prostituição.

A estação

A estação atende duas linhas de trem e duas de metrô, e faz viagens para região metropolitana de São Paulo

Só fui saber das obras quando desembarquei na última estação da linha amarela, e depois de seguir as placas me vi cruzando o beco até entrar na estação por uma entrada lateral. A estação da Luz funciona de domingo a sexta, das 4h40 à 00h19, e aos sábados, das 4h40 à 1h00. Dentro da estação fica o Museu da Língua Portuguesa, no arredores ficam os três prédios da Pinacoteca e na saída do salão principal da estação fica o Jardim da Luz.

O nome Luz se deve a Domingos Luís, um dos primeiros povoadores da cidade de São Paulo, que mudou-se para o local em 1601 e construiu uma pequena capela em homenagem à sua santa de devoção: Nossa Senhora da Luz. A estação foi construída entre os anos de 1895 e 1901, projetada pelo arquiteto britânico Charles Henry Driver para a São Paulo Railway, empresa sediada em Londres e que foi responsável por erguer o primeiro trecho ferroviário do estado.

Atualmente, a região tem um clima que parece hostil. A viatura da polícia, estacionada na frente da Pinacoteca, casa com a placa que avisa os visitantes para ficarem atentos ao furtos de celular, e que o museu não tem parceria com estacionamentos ou guardadores autônomos. Estacionar nesses locais é de responsabilidade total do visitante. Mas essa tensão não entra nos museus.

As Pinacotecas

A Pinacoteca conta com três edifícios espalhados pela região da estação da Luz e o mais antigo recebe atualmente a exposição da artista argentina Marta Minujin até janeiro de 2024

A Pinacoteca do Estado de São Paulo é o mais antigo museu de arte da cidade, fundado em 1905 e instituído como museu público estadual em 1911. Atualmente o acervo é dividido em três edifícios – Pina Luz, Pina Estação e Pina Contemporânea. O edifício mais antigo, que fica em frente a estação da Luz, e foi projetado pelo arquiteto Ramos de Azevedo, é o mais conhecido.

As exposições lá ficam divididas em três andares: no primeiro ficam as itinerantes, e até janeiro de 2024, quem o ocupa é a artista plástica argentina Marta Minujin, nascida em Buenos Aires e amiga de Andy Warhol. No segundo e terceiro andar ficam obras do acervo que conta com quadros de Anita Malfatti, Tarsila do Amaral e Lazar Segall. O local conta com o Flor Café que fica na parte externa, dento do Jardim da Luz.

Maquete do Jardim da Luz que fica exposto na Pinacoteca mais antiga

Os dois outros prédios da Pinacoteca ficam próximos a estação. O primeiro é o Pina Estação, que ocupa o prédio do antigo Armazém Central da Estrada de Ferro Sorocabana, também projetado por Ramos de Azevedo, e que posteriormente foi sede do Departamento de Ordem Política e Social (DEOPS) entre 1942 e 1983. Ela pode ser acessada pelo Boulevard João Carlos Martins, a partir da plataforma 1 da CPTM na estação da Luz.

O prédio possui seis andares, que contam com um café, um auditório e dois andares para as exposições temporárias. Nos demais andares fica o Memorial da Resistência de São Paulo, uma instituição cultural que visa preservar as memórias da resistência e das repressões políticas ocorridas no Brasil e no estado de São Paulo.

O terceiro edifício que compõe o conjunto das Pinacotecas é a Pina Contemporânea, que fica dentro do Jardim da Luz, na parte de traz da Pina mais antiga, e que tem acessos pela Avenida Tiradentes e Rua Ribeiro de Lima. Até 2008, o local era uma escola estadual, que foi transferida para um outro prédio no bairro do Bom Retiro. Em 2018, o terreno foi concedido à Secretaria da Cultura e Economia Criativa do Estado de São Paulo, e inaugurado em março de 2023 como uma praça dentro de outra praça.

O local possui duas galerias com obras do acervo, dois ateliês para atividades educativas, a Biblioteca e Centro de Documentação e Memória (CEDOC), além de uma loja de souvenires, um auditório e a área administrativa do conjunto das três pinacotecas. Todas as Pinacotecas possuem os mesmos horários (de quarta a segunda-feira das 10:00 às 18:00), valores (R$30 inteira e R$15 meia) e podem ser visitadas com um único ingresso.

Cinquenta mil palavras e uma só língua

Corredor do terceiro andar do Museu da Lingua Portuguesa onde fica parte das exposições fixas do local

As Pinacotecas são três dos quatro museus que ficam no quadrilátero da estação da Luz. O quarto é o Museu da Língua Portuguesa, que fica dentro da estação e pode ser acessado a esquerda do salão principal, mas caso você venha por fora da estação, há uma entrada bem em frente à Pinacoteca.

Diferente dos outros três, os quais tendem a chamar a nossa atenção a partir do que vemos, esse nos seduz através dos ouvidos. O Museu da Língua Portuguesa faz uso de diversas tecnologias para falar sobre a língua portuguesa através do som, com depoimentos, declamações, sermões e tudo que possa ser feito em português. A língua portuguesa tem 50 mil palavras oficiais, e tudo funciona sob justificativa de que a língua é o que nos faz humanos e o que nos permite viver em sociedade.

É recomendado que você comece pelas exposições fixas, que ficam no terceiro e segundo andar, onde também há um acesso ao terraço do prédio, que leva o nome de Paulo Mendes da Rocha, arquiteto que projetou o local, e tem vista para a torre do relógio da estação da Luz e um pequeno café para quem quiser comer algo.

No primeiro andar ficam as exposições temporárias, que quando passei por lá era Essa nossa canção, em cartaz até março de 2024, que explora a ligação entre a língua portuguesa e a música, com vídeos de pessoas aleatórias declamando clássicos da música brasileira como Asa Branca a Diário de um Detento. O museu fica aberto de terça a domingo, das 09:00 às 16:30. Os ingresso custam R$20 reais a inteira e R$10 a meia, e a entrada é gratuita aos sábados.

O jardim

O Jardim da Luz é o parque mais antigo de São Paulo, aberto ao público em 1825

Originalmente um jardim botânico, o Jardim da Luz foi transformado em jardim público em 1825 e é o parque mais antigo de São Paulo. Fica bem em frente da estação da Luz e reúne pessoas que por lá cruzam ou por lá ficam e que pouco se importam com quais são as exposições em cartaz nos museus ao redor. O jardim possui uma academia a céu aberto, e fica aberto de terça a domingo das 06:00 às 18:00.

Em uma cidade de 12 milhões de habitantes, é fato de que você vê de tudo e ao mesmo tempo em São Paulo, e um local onde 450 mil pessoas passam diariamente não é dos mais seguros. Por esse motivo, segundo a Secretaria de Segurança Pública do Estado (SSP), a Polícia Militar realiza patrulhamento na área para garantir a segurança de frequentadores dos museus e transeuntes do jardim.

As rondas, segundo a secretária, são intensificadas principalmente no período entre 18h e 2h (horário que os museus e o jardim já fecharam). Além disso, a Polícia Civil também trabalha para reprimir e identificar autores de furtos e roubos que atuam na região. Entre os 96 distritos que a capital paulista é dividida, o do Bom Retiro, onde fica a estação da Luz, conta com 33 mil habitantes, o suficiente para ser mais populoso do que 4.496 cidades brasileiras. Mas isso é apenas o número de residentes do local.

É assim numa cidade grande, impessoal e compartimentada como São Paulo – onde morrem cerca de 400 pessoas por dia, e onde os vivos correm atrás de apartamentos vazios. O jornal do dia traz fotos de mortos na página 29; a página 31 estampa fotos de pessoas que noivaram e a primeira página ostenta fotos dos que governam o mundo, desfrutando dos dias de glória enquanto não vão parar na página 29.