
Pelas indicações que eu tinha, uma das homenagens feitas a Rita Lee no bairro onde ela nasceu ficava na Rua Prudente de Morais, mas é melhor observar o lado em que você vai desembarcar na estação Vila Mariana, linha azul do metrô de São Paulo, pois caso seja pelo lado par, você terá que seguir para fora da estação, na Avenida Professor Noé Azevedo, e cuidar a parede quase na esquina de um restaurante chamado Batidão. Lá está um dos dois murais feitos em homenagem a cantora.
Rita Lee nasceu no dia 31 de dezembro de 1947, em São Paulo, a terceira filha de uma família de classe média cujo pai era norte-americano e a mãe brasileira. Tornou-se uma das artistas mais marcantes do Brasil através do sucesso, primeiro com a banda Os Mutantes, e, posteriormente, em carreira solo, embora sempre acompanhada do marido e alma gêmea nas composições, Roberto de Carvalho.
O sucesso a levou ser beatificada como padroeira de São Paulo, e em quase 60 anos de carreira cantou sobre a cidade de maneiras diversas. A marginal da Vila Mariana, cresceu em um bairro que hoje é um polo gastronômico, próximo ao parque Ibirapuera, mesmo local onde Rita foi velada em uma cerimonia aberta ao público um dia depois de morrer em 08 de maio de 2023, e que futuramente também há de levar o nome da cantora.
A Vila Mariana e Os mutantes

Rita Lee, começou a estudar piano ainda criança, sonhava em ser atriz de cinema ou veterinária. Chegou a cursar Comunicação Social na USP, mas saiu no primeiro semestre para se dedicar a música. A primeira casa que morou com os país na Vila Mariana ficava na Rua Joaquim Távora e já não existe mais. A casa deu lugar a um imóvel da Igreja Batista, que não tem nada a ver com os irmãos Arnaldo e Sérgio, com que Rita formou Os Mutantes em 1966.
A mutantolandia, casa aonde a banda morava e ensaiava, ainda existe no bairro da Pompéia. Foi lá que os irmãos Baptista cresceram, e outras bandas como Made In Brazil foram formadas. Em 1968, Rita e Arnaldo se casaram, e juntos se mudaram para a Serra da Cantereira no início dos anos 1970, onde o casamento com Arnaldo e a banda terminaram, pelo menos para Rita, que foi expulsa sob a alegação que o grupo iria para um lado mais Rock Progressivo.
Rita juntou os cacos e voltou para a Vila Mariana, onde anunciou o retorno, dessa vez com a banda Tutti Frutti. Juntos, cantora e grupo lançaram quatro álbuns e emplacaram sucessos como Agora Só Falta Você, Cartão Postal e Ovelha Negra. Em 1975, através de Ney Matogrosso, Rita conheceu Roberto de Carvalho, com quem casou e compôs uma trilha sonora autobiográfica de um casal apaixonado com canções como Mania de Você, Doce Vampiro e Caso Sério.
Rita e Roberto moraram juntos em um prédio que ainda está de pé, na Rua Eça de Queiroz, Vila Mariana. O bairro mudou muito da época de Rita, e a versatilidade gastronômica é o ponto alto nos dias de hoje. Só na Joaquim Távora, mesma rua onde ficava a casa dos pais de Rita, você tem pelo menos 16 opções de restaurantes (alguns mais sofisticados que outros) para decidir o que comer.
Os casarões da década de 1940, em sua maioria, foram parar no chão para dar lugar a prédios e condomínios. Alguns aproveitados no quesito cultural como o museu da Casa Modernista. Na Vila Mariana também fica o Instituto Biológico, que abriga festas e feiras, a Cinemateca Brasileira, que sedia festivais e exibe parte de seu acervo em sessões especiais, e o SESC que conta com toda uma programação de eventos culturais.
Além do mural na Avenida Professor Noé Azevedo, ao lado frente da estação do metrô Vila Mariana, também é possível encontrar uma homenagem a cantora na rua Vergueiro, altura do número 2.676, logo em cima da balada Jai Club, perto da estação Ana Rosa. Além da região sul de São Paulo, Rita Lee também morou em bairros como Paraiso, Pacaembu, Cantareira e Higienópolis.
Padroeira da cidade

Multi-instrumentista, Rita Lee era versátil não só no palco. A personalidade transparente, o ar despudorado e o raciocínio rápido fizeram dela uma comunicadora nata tanto no rádio (Radioamador, na 89 FM) quanto na TV nos programas TVLeezão, da MTV, Madame Lee e Saia Justa do GNT. Em 1991, lançou o LP Bossa’n’roll, seu projeto financeiramente mais bem-sucedido, mas que a levou ao fundo do poço, como narra na autobiografia lançada em 2016.
O livro é um relato direto e reto sobre os problemas com o abuso de álcool, drogas e o estupro que sofreu aos seis anos por um técnico que foi a sua casa consertar uma máquina. Na saúde e na doença, Rita e Roberto foram juntos até a aposentadoria da cantora em 2012. A despedida inicial seria no festival de Verão de Sergipe, mas durante a apresentação, ao ver policiais abordando pessoas da plateia que fumavam maconha, Rita interrompeu o show, xingou a polícia e acabou detida.
Com o incidente, uma nova despedida foi marcada, dessa vez no dia 25 de janeiro, no Vale do Anhangabaú, aniversário de São Paulo. A capital onde Rita dizia que o amor é imprevisível (Lá Vou Eu) e o calor a fazia transpirar (Vítima), e que em 1993 fez um convite junto com Itamar Assumpção e as Orquídeas do Brasil, par as pessoas virem até São Paulo para ver o que é bom para tosse na música Venha Para São Paulo.

Após a aposentadoria dos palcos em 2013, viveu com Roberto em uma casa de campo onde pintava, cozinhava, escrevia e cuidava dos bichos de estimação. “Quando eu morrer, posso imaginar as palavras de carinho de quem me detesta. Algumas rádios tocarão minhas músicas sem cobrar jabá, colegas dirão que farei falta no mundo da música, quem sabe até deem meu nome para uma rua sem saída”, escreveu na autobiografia.
Rita morreu em decorrência de um câncer no pulmão em maio de 2023, e quase tudo que havia escrito se confirmou. A única diferença é que ao invés da rua sem saída, a Praça da Paz, do Parque Ibirapuera, passará a ter o nome da cantora. A Câmara de Vereadores de São Paulo aprovou em primeira sessão a adição do nome Rita Lee ao parque que passaria se chamar Parque Ibirapuera Rita Lee. Ainda é necessário uma segunda votação para ser encaminhada para a sanção do Prefeito.
Na autobiografia, a cantora descreve a área que atualmente fica o parque como “Floresta Encantada”, onde semanalmente ela ia ao planetário. Tal proximidade fez com que o local fosse escolhido para velar àquela que se autodenominou o lazer de quem trampa, a tia tiete do Tietê’, a bendita Santa Rita de Sampa.